Total de visualizações de página

domingo, 1 de maio de 2011

Por que a pena de morte deve ser abolida não só legalmente, mas de nossas mentes?

                                                                                                                    
Uma forca na escuridão à espera de
uma cabeça
                                                                                                      

                                            Porque a pena de morte deve ser, em definitivo, abolida, não só legalmente, mas de nossas cabeças. As discussões sobre a pena de morte são valetudinárias, se perdem na escuridão dos pensamentos. Quando um crime chocante ocorre a sociedade se revolta e cria uma névoa de ansiedade que envolve este fenômeno social, ou seja, um grande palco é armado, inconscientemente, para que possa ocorrer a punição do chamado criminoso, no entanto estes ingrediente são perfeitos para um grande erro judiciário, algo muito comum. Porque isso acontece? Porque temos sede de justiça, temos pressa de justiça, elementos psicológicos no fenômeno do crime. É um sentimento que se perde nos tempos.  A pena de morte foi uma prática usada universalmente para punir os crimes mais terríveis. Sua aplicação vem desde épocas remotas, tendo surgido entre as primeiras civilizações. Conforme o desenvolvimento da humanidade sua prática tem sido banida e a tendência é que sua aplicação seja reduzida ou extinta. Durante muito tempo foi aplicada de modo consensual e acabava por se transformar em espetáculos públicos quando de sua execução, um verdadeiro circo em que o palhaço era o carrasco.

                                     Os defensores da pena macabra elencam três argumentos ou teses capitais para a sua previsão jurídica:

                                         Crimes graves devem ser punidos exemplarmente. Os defensores desta tese acreditam que certos crimes devem só ter uma resposta social ou a pena de morte como pena exemplar. É a velha Lei de Talião que continua assombrando.No entanto, todo o radicalismo afronta o princípio da racionalidade humana e jurídica. Se o homem quer ser racional duvido que este seja o caminho.
Cadeira Elétrica
O escândalo da pena
 de morte

           Intimidação e Prevenção. Segundo alguns a pena de morte intimida os infratores e sendo assim ela tem um caráter preventivo. Estudando o assunto, as estatísticas não confirmam esta tese. Países em que a pena de morte foi abolida não houve o aumento da criminalidade e nem a diminuição quando esta pena foi criada.

                                      A sociedade não deve sustentar criminosos. Este argumento é falacioso uma vez que o crime é de grande interesse da sociedade. A sociedade tem interessa na culpa e na absolvição do acusado, o que interessa é que não haja a chamada Justiça Privada ou Justiça Com Às Próprias Mãos, algo horripilante.O Estado gasta quantias estratosféricas com coisas de menor valor e o número de condenados à pena de morte seria pequeno. Ao contrário disso, aplicar uma pena severa com todas as formalidades legais seria caríssimo.
                                          
                                          
                                      Os americanos não aplicam esta pena? Um argumento secundário é este. No entanto, os americanos não são tão democráticos como eles gostam de dizer e muitos imaginam. Os americanos se julgam democráticos, mas a sua democracia ainda está longe dos valores ideais. A ONU já fez várias críticas duras sobre o seu sistema jurídico. A prisão em Guantánamo mantida pelos EUA é objeto de pesadas críticas de respeitáveis instituições internacionais. Será que todas elas estão erradas e os americanos certos?
                                      As antíteses mortais:

Capa da obra Leviatã
de Thomas Hobbes,
1588-1679
                                      O Estado tem direito de tirar vidas? A nossa resposta é não. A vida, a matéria, ainda, é um mistério, o grande segredo deste mundo, não compreendemos a matéria em sua essência, portanto, não é nenhum erro dar um caráter sagrado à qualquer espécie de vida. Se um homem não tem este direito muito menos o Estado. O grande olhar errado sobre o Estado é pensar que ele é uma espécie de Deus. Nas nossas observações empíricas temos percebido este olhar do cidadão comum em relação à esta entidade. O Estado é apenas uma ficção jurídica ou pouco mais que isso. Para nós a melhor definição do Estado é a demoníaca de Thomas Hobbes; este pensador vislumbrou o Estado como o grande Leviatã ou como um monstro, embora necessário. Em resumo, se o homem não pode tirar a vida de outrem, o Estado como um todo e composto de homens, como um conjunto fechado de homens, não pode tirar a vida. Sem embargo do Estado ser necessário, ele deve ser combatido diuturnamente como se fosse um Leviatã, nesta encruzilhada mora a beleza da democracia ou o homem é a favor e contra o Estado, neste jogo duplo teremos o seu aperfeiçoamento.                                                                                                                                                                                                                                 
                              Princípio da falibilidade humana. O Poder Judiciário como parte imprescindível do Estado é composto de homens de carne e osso. E onde tem a natureza humana teremos o princípio da falibilidade. O erro é um fantasma na vida dos homens, tanto é, que a parêmia latina errare humanum est é aceita como princípio de sabedoria. A dimensão da falibilidade humana é ligada à dimensão do erro judiciário, porquanto nossa justiça não é a justiça perfeita e absoluta, ao contrário, é falível, como falível é o homem. Assim, como o erro judiciário se apresenta diariamente em nossos tribunais e este é inevitável, a possibilidade de erro num julgamento deveria de afastar a possibilidade de aplicação de uma pena que traria em seu bojo o princípio da irreversibilidade. Falibilidade e irreversibilidade não combinam, é uma contradictio in terminis. Destarte, a pena de morte não combina com o homem, com o errare humanum est.
...O Estado como Deus...
                                    A pena perpétua seria suficiente. Explico que a pena perpétua não é, em muitas legislações, para sempre, é uma pena com uma longa duração. Como ir de oito a oitocentos sem passar pelo oitenta ou a pena perpétua. A resposta perpétua tem a inteligência de poder ser revista a qualquer momento. A punição maior depois de executada não teria mais sentido em ser revista, a não ser para efeitos indenizatórios.O ser humano é o ser da superação e, por conseguinte, capaz de melhoramentos, assim, depois de uma queda pode ocorrer a elevação do ser-queda-elevação.
...o Estado como monstro...
                                        
                                                                                                           ...só que toda vingança cheira mal
                                                                                              Traumas, escândalos e sensacionalismos. A pena de morte tem efeitos traumáticos e sensacionalistas em uma sociedade organizada e causa perplexidade no povo quando da sua aplicação, mormente com divisões ideológicas fervorosas tanto a favor como contra. Se toda Lei é regida por um princípio supostamente racional, com todas às veras, se esta pena pudesse ser substituída por outra como uma pena de duração longa, não haveria nenhum motivo para que isto não aconteça. A cruz foi um escândalo, a pena de morte é outro escândalo e o Estado, que deve pelo menos ter ares de sabedoria, deve sempre evitar traumas, escândalos e sensacionalismos. Muitas pessoas vivem de escândalos estatais, pensem em alguns setores da imprensa, exemplificativamente.
muitas pessoas vivem de escândalos
                                                     Motivos psicológicos e imediatistas.Com este raciocínio chegamos à conclusão que os reais motivos da pena de morte são psicológicos e imediatistas, ou seja, uma vingança levada a efeito pelo Estado em nome de uma sociedade traumatizada e imediatista.  Só que toda a vingança cheira mal, não é educadora no sentido maior da palavra, se agrada a muitos, causa perplexidade em outro tanto e no final não tem o efeito intimidador no combate ao crime. O crime como fenômeno social tem milhares e milhares de causas, basta pensarmos a respeito, não é uma causa isolada como a pena branda que leva ao delito.
  
                                      Dom Pedro II e o  desastre do Brasil na aplicação da pena de morte. O Brasil nunca foi feliz na aplicação da pena de morte, Dom Pedro II que o diga, no ano de 1.822 o Brasil se tornou independente de Portugal e no ano de 1.824 foi promulgada a nossa primeira Constituição, sobrevindo logo depois o Código Penal de 1.830. Ambos arcabouços jurídicos previram a pena de morte, a qual era cominada para os crimes de homicídio, roubo seguido de morte, insurreição e no caso de escravos que obtinham a liberdade com violência. O primeiro homem a ser condenado a pena de morte na vigência destes sistemas jurídicos foi o Sr. Mota Coqueiro no ano de 1.855, na cidade de Macaé, do Estado do Rio de Janeiro. Só que o apenado era inocente, tudo não passava de uma armação com finalidade política. D. Pedro II que na época se recusou a comutar a pena e, depois, ficou muito impressionado e abalado com a descoberta da inocência do apenado e a partir de então passou a comutar sistematicamente qualquer pena de morte. Destarte, desta lição terrível chegamos à conclusão  educadora que o erro judiciário é muito mais real e possível do que se imagina;                                                         ...errarehumanumest...                                                                                                                                                                                             
                                                             Epilogando. A pena de morte vai de encontro ao princípio da racionalidade que deve preponderar em uma sociedade regida pelos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. O Brasil, exemplificativamente, quando aplicou a pena de morte se deu mal. O Sr. Mota Coqueiro é um exemplo de grave erro judiciário. Em caso de erro judiciário uma pena drástica não permite a reparação satisfastória.  
                   
A Destruição de Leviatã de
Paul Gustave Doré,1832-1883
Um dos maiores ilustradores de
livros de todos os tempos

                                             Zé Perrengue.
                            



Um comentário:

  1. Zé Perrengue, seus textos são sempre muito especiais. Parabéns!!!! :)

    ResponderExcluir